Eu estava a morrer nas empresas

Eu estava a morrer nas empresas

Se estavam à espera de um artigo todo floreado, cor-de-rosa e cheio de resoluções de início de Ano, então não será este.

 

Também não será só sobre sangue, suor e lágrimas. Tenho aprendido a ver o lado positivo das coisas, mesmo das menos boas. E este artigo é um bom exemplo disso. E no final, deixo cinco grandes lições que aprendi.

 

Também não vou falar de burnout. Não me refiro a essa “morte”. Refiro-me a um "cocktail explosivo" que apareceu na minha vida. Refiro-me a um série de acontecimentos bons e maus que me trouxeram até onde estou hoje. Os bons, neste caso, só servem para reforçar, que cada realidade é uma realidade, cada empresa é uma empresa e cada fase da nossa vida é uma fase. Adorarei para sempre várias empresas por onde passei. As que não me mataram, moeram. Mas eu também me "matei" a mim própria porque adormeci. Não adormeça você também.

 

Na verdade, só me dei conta que isto aconteceu mesmo há pouco tempo. Eu sempre adorei trabalhar em Marketing e em Gestão de Marcas. Atenção, não disse que sempre gostei do que fazia nem de onde o fazia, até porque isso não seria verdade.

 

Sempre que não estava satisfeita, procurava motivar-me. Ui, se há conceito importante no mundo das empresas é a auto-motivação. Mas esta não é eterna e não é a solução para tudo. E chegava a um ponto em que o que eu queria mesmo era mudar de empresa. Estava insatisfeita, sentia-me estagnada e queria mais. Mais ou diferente, ainda não sei bem qual delas.

 

Agora, olho para trás e faço uma retrospectiva dos meus últimos anos. Eu nunca tinha pensado em ser empreendedora. Sempre achei que iria trabalhar “para sempre” nas empresas. Só que não. Estava tão focada nas marcas que trabalhava, na função, na empresa, na sua dimensão, nas condições, que nem parava para pensar se estava realmente feliz. Eu tive experiências tão boas, tão positivas. E tive outras péssimas, que me fizeram chorar, duvidar de mim, duvidar do que devia ou não devia fazer.

 

Eu chorei. Chorei no início da minha carreira e até acho um pouco “normal”. Eu era tão jovem, tão “verde”. Até acho que me fez “bem” nessa altura. Mas chorar dez anos depois já não me parece tão bem. 

 

Quando decidi lançar-me a solo, muitas pessoas olharam para mim e achavam que eu estava “louca”, que iria voltar às empresas, que isto era demasiado “diferente”, que o “normal” era seguir uma linha recta na carreira. Pois essas pessoas, são aquelas que me dão mais “pena”. Não é bem pena, porque eu já aboli este sentimento há muito tempo. Eu sou mais feliz agora. Elas, estão cada vez mais infelizes.

 

Não dá para lutar contra certos “sistemas”. Ou alinhas ou o melhor é saltares fora. Se alinhas, acabas corrompido ou tão exausto que já nem te reconheces. As empresas têm coisas fantásticas. Mas só quem lá está dentro é que sabe. Para o bem, a minha personalidade não permitiu que eu me corrompesse.

 

Eu vi pessoas a saírem dos gabinetes dos chefes a chorar, eu vi pessoas a serem despedidas só porque eram mais bonitas do que a chefe, eu vi pessoas a darem tudo e a serem desprezadas, eu vi pessoas a serem “obrigadas” a fazerem coisas "pouco correctas", eu vi pessoas e situações tão más que nunca mais as quererei ver.

 

Depois de ter feito tudo o que se podia fazer na minha área, eu queria outro desafio. E fui. Além de não ser o que imaginava, constatava que também não estava realizada. O problema era das empresas? Não. O "problema" era eu. E esse problema fez com que tomasse decisões que não eram as certas, porque eu não conhecia a verdadeira raiz do problema.

 

Ignorei a minha intuição, que me dizia para ir numa determinada direcção. Depois, vivi um ano em negação, um ano inteiro. Isto vai mudar, hoje não foi assim tão mau, consegui uma conquista (que deveria ser algo já implementado), pensava eu. Vivi num ambiente que não era o "meu".

 

Com tudo isto, o resultado foi eu ir ao limite. E mais uma vez, não falo de burnout. Aquele ambiente não era para mim. Acho que a maior parte das pessoas nem pensa nisto. Se está no ambiente certo para ela. Se estão a ser elas próprias. Se podem praticar e agir de acordo com o que acreditam.

 

Vejo muitas pessoas a “calarem-se” durante anos. Eu não consigo. Eu não consigo não querer mais e melhor. Eu não consigo pôr o meu nome em projectos que condenam as empresas. Eu não consigo fingir que sou estúpida quando não o sou. Eu não consigo lidar com gente má que só pensa em si própria. Lutei muito, falei muito para as paredes, passei de bestial a besta em dias. Tive de ser actriz. E não há coisa pior para mim do que fingir. Imaginem fingir um mês inteiro. Claro que há coisas que vamos aprendendo a gerir com a maturidade mas quando bate de frente com os nossos valores, fica mesmo muito complicado. Não cheguem ao vosso limite. Façam para que isso não aconteça.

 

Conheço pessoas que saíram de empresas super “fantásticas”, muito bem conotadas nacional e internacionalmente. E depois? Mais do mesmo. Injustiças, privilégios suspeitos, nenhuma progressão. Há pessoas que não falam e há empresas não querem ouvir. Conheço pessoas que nem elas próprias sabem o que ainda estão lá a fazer. Mudam de empresa em empresa, mas no fundo sentem que o seu lugar não é ali, ou pelo menos daquela forma. Mas têm medo, têm incertezas. São julgadas. Ouvem pessoas que não as ententem. Umas seguem a sua própria cabeça, outras não. Julgamento vai haver sempre. Coragem é que não. Só que o tempo está a passar. E a questão não é ficarmos mais velhos. A questão é estarmos a "perder" tempo. Se eu não tivesse parado por alguns meses e dedicado um tempo a pensar realmente na minha vida, se calhar também estaria como elas. Agora é mais fácil, olhar para trás e pensar nisto tudo. Mas eu sei que no nosso dia-a-dia não há muito espaço e força interior para isso. É preciso pensar e colocar tudo muito bem organizado na nossa cabeça.

 

O dinheiro é importante, mas não é tudo, pelo menos para mim. Eu também era movida pelo desafio, pela liderança das marcas, pelas boas pessoas ao meu lado. Quando não há isso, nada faz sentido.

 

Vivia numa rotina. Uma rotina que não me preenchia, que não me estimulava, em que não evoluia. Eu não sabia e acho que mais ninguém à minha volta o sabia. Quem me dera que alguém me tivesse despertado, desafiado, espicaçado. As pessoas à nossa volta desempenham um papel importante e podem ter um peso relevante nas decisões que tomamos. Rodeie-se de pessoas diferentes. Pessoas que percebam do que falam. Pessoas que o entendam. Pesssoas com experiênciais reais.

 

Desde que me lancei com o meu projecto, sinto uma diferença enorme. E agora falo do meu cérebro. Da minha capacidade de raciocínio, criatividade, invenção, ousadia,… Parece que estava a andar a 20 km/h e agora já consigo 120km/h (ou mais, mas não quero passar os limites 😊).

 

Estou numa missão diferente. Uma missão que me alegra todos os dias. Que me faz querer trabalhar dia e noite, que me faz sair da "caixa" onde eu estava. Existe todo um mundo que eu não me estava a dar conta. Mas agora estou.

 

Também tenho limites, aqueles que se ouvem muito, como o budget. Também tenho dificuldades. Mas consigo ter milhares de ideias e criar. Consigo desenvolver-me a um ritmo que eu não imaginava. Todos os dias aprendo coisas novas. Todos os dias. Conheço pessoas incríveis. Nas empresas também conheci, mas depois eram sempre as mesmas. Agora não. Estou constantemente a desafiar os meus (poucos) limites. Quero rodear-me do bem. Se vejo que algo ou alguém não vai funcionar, não avanço. Ajudei muitas marcas de produtos. Mas agora ajudo muitas pessoas. É um enorme privilégio. E quero ajudar muitas empresas.

 

Não sei o que vai acontecer daqui para a frente. Posso imaginar. Mas a vida muda. Nós mudamos. E o que ontem era bom para nós, amanhã poderá já não ser. O que ontem queríamos muito, amanhã podemos já não querer. O que ontem nos sabia bem, amanhã poderá já não saber. Não acreditarei mais em linhas rectas. E sei que parar é morrer. E eu não quero morrer.

 

Eu quero voltar às empresas, muito. E vou voltar. Mas não da mesma forma. Não a fazer o que fazia. Mas sim a fazer as coisas à minha “maneira” para o fim pelo qual eu sempre lutei: o sucesso da empresa. Eu escolherei as empresas com as quais quero trabalhar. E têm de ser honestas, transparentes e tal como as pessoas não trabalhar para o “ego”, neste caso prémios. Têm de praticar o que apregoam.

 

Eu quero ajudar as empresas e as pessoas que lá trabalham. Porque eu sei como é. O bom,o mau e o assim-assim.

 

AQUI ESTÃO 5 GRANDES LIÇÕES QUE APRENDI:

 

1 – O problema não está nas empresas, nos colegas ou nos chefes. Nós somos o problema. A tendência é para culparmos os outros pelo nosso estado e muitas vezes pelas coisas más que acontecem à nossa volta. Não digo que em alguns casos, estas “pessoas/organizações” não tenham alguma parte de culpa no que acontece. Mas a grande responsabilidade de estarmos a viver o que estamos realmente a viver, é nossa. Podemos achar que tem de ser, que por enquanto temos de “aguentar”, que tudo vai mudar mas a verdade é que se estamos ali, àquela hora, naquele lugar, com aquelas pessoas é porque assim o decidimos.

 

2 – O preço de não sermos fiéis a nós mesmos será mais elevado do que se formos. Nós somos como somos. Algumas coisas podemos e devemos trabalhar, mas a nossa personalidade e os nossos valores são a nossa personalidade e os nossos valores. E quando começamos a ceder e a fazer o que não está certo, só porque alguém nos pediu, estamos a assinar com o nosso nome. Lamento, mas a não ser que lhe apontem uma arma à cabeça ou lhe façam uma ameaça, está a ser responsável pelos seus actos e vai ter de aguentar as consequências.

 

3 – Devemos respeitar as decisões dos outros. Eu não compreendi e hoje ainda não compreendo porque é que algumas pessoas se sujeitam a algumas coisas, nomeadamente pessoas que conheço bem. Mas devo respeitar. Admiro muito, certas pessoas que aguentam imenso. Mas o imenso tem um fim, ou deverá ter. Somos diferentes, temos valores diferentes, limites diferentes. Acho sim, que devemos dar-lhes ferramentas para elas pensarem um pouco e ganharem novas perspectivas, mas não as censurar. Confesso que me custa, principalmente quando gosto muito das pessoas e consigo prever que o final não será cor-de-rosa.

 

4 – Cada caso é um caso, cada empresa é uma empresa, cada equipa é uma equipa e cada pessoa é uma pessoa. Parece básico e simples mas pode não o ser para todos. É fácil generalizarmos e classificarmos as empresas de boas, más,… Na verdade, no mercado das empresas também há uma grande guerra de “egos”, mas isso é outro campeonato. Trabalha-se muito para se ficar bem na fotografia, na reportagem, no vídeo, no website, ganhar uns prémios…E mesmo dentro de cada empresa, há muita heterogeneidade, há pessoas felizes, pessoas infelizes, departamentos felizes, departamentos infelizes. Cada pessoa é uma pessoa. Não é um número, não é um recurso, é uma pessoa.

 

5 – As empresas não são responsáveis pela felicidade das pessoas. A pessoa é que é responsável pela sua felicidade. As empresas podem contribuir sim, para o seu bem-estar, desenvolvimento e condições de vida e trabalho mas as pessoas é que têm de assumir o controlo da sua felicidade. Tenho lido coisas sobre a felicidade nas organizações que me assustam um pouco, por serem tão desfasadas da realidade. Podemos ficar na teoria ou podemos conhecer as várias realidades de perto. E mais: eu acredito que há pessoas que não são para certas empresas e há empresas que não são para certas pessoas!

 

Parem mais, pensem mais, assumam as rédeas da vossa vida e carreira e sejam felizes!